sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Mais um texto finalista da Olimpíada de Língua Portuguesa em 2014: a crônica “Feira: cheiros, temperos e versos”.


Feira: cheiros, temperos e versos
Aluno: Francisco Alves Quirino

O sol ainda tímido fazia nascer uma bela manhã de sábado. Dia da feira que movimenta o sertão pernambucano. Nos primeiros instantes matutinos saio de casa junto com minha mãe. Nosso intuito era fazer as compras da semana.
As frutas, as verduras e os cereais compõem os itens básicos, cuja densidade impregna nossa sacola de náilon colorido, onde mamãe guarda com zelo os alimentos que irão nutrir toda a família durante mais sete dias.
Contornamos a praça e fomos à rua da feira. Ao passarmos pelas primeiras barracas, o cheiro irresistível dos espetinhos de churrasco se misturava à beleza atraente dos pastéis da barraca de dona Josefa, que não traz a realeza em seu nome, mas verdadeiramente é a rainha na arte de fazer pastéis.
Mais adiante, o colorido das frutas se confunde com as verduras, tornando-as brilhantes e quentinhas, aquecidas pelas centelhas de sol que perpassam pelas frestas da lona que recobre as barracas. Minha mãe para e compra algumas delas. Não muito longe, outra banquinha, esta de temperos, deixa exalar um aroma agradável da pimenta sendo moída junto com o cominho, que, girando na máquina, se transforma num pozinho fino, pronto para a alquimia dos almoços deliciosos dos domingos. Não sei se já observaram, mas os cheiros têm o poderoso mistério de nos transportar a lugares guardados em nossa memória e nesse instante me veio à lembrança o odor convidativo das panelas aquecidas em fogão a lenha, cujo perfume percorre terreiro a fora as casinhas do sertão.
A feira é o espaço de encontro do sertanejo, ela promove a união da área urbana com a rural, lá ele compra, vende, conversa e aprende.
Nesse dia, a matriz permanece aberta para os fiéis campesinos, pois para eles a necessidade de alimentar a fé se iguala à de alimentar o corpo, tornando-o forte para enfrentar as dificuldades que a vida impõe.
Meu amigo leitor, confesso que ficar tanto tempo em pé me deixa cansado e com vontade de voltar para casa, mas entre tantos outros sons surgidos na feira um deles me chama a atenção. Esqueço meu cansaço e convenço minha mãe a irmos aonde se encontra um aglomerado de pessoas formando um círculo no meio do qual está um representante da mais autêntica cultura do nosso povo: o cantador de viola.
Vejo de longe o protagonista, homem simples tal qual os outros que ali estão. Porém, algo o diferencia, pois sob o sol das 11 horas ele dedilha o instrumento e canta improvisadamente versos magistrais. Sua poesia abranda o sofrimento, fazendo com que os espectadores esqueçam por um breve tempo todos os seus eventuais problemas. As gargalhadas provocadas pelas sextilhas bem humoradas e os aplausos calorosos pelos motes bem engendrados que em redondilha menor denunciam os descasos maiores dos quais nossa gente é vítima me contagiam. Eu fico encantado com tamanha imaginação, alguém com tão pouco estudo, mas com tanta sensibilidade, para transformar em poesia o cenário do sertão. O sertão que você, compadre leitor, conhece muito bem.
Prestigiamos o artista, enquanto ele exercia sua importante profissão. Vimos muitos motes serem criados para desafiar a astúcia poética do cantador. Os risos eram constantes, mas também houve o momento em que os que ali estavam, ao ouvir uma estrofe sobre alguma casa de taipa abandonada, inclinaram a cabeça repetidamente, em sinal de concordância e saudade.
O sol já estava no meio do céu. Era meio-dia. A apresentação chegou ao fim e o poeta se despediu. Por fim, eu e minha mãe voltamos para casa e nesse dia levei comigo três coisas: os cheiros, os temperos e os versos.


Professora: Patrícia Amaral Barbosa

Escola: Centro de Excelência Municipal Dom João José da Mota e Albuquerque – Afogados da Ingazeira (PE)

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Uma das memórias literárias finalistas em 2014 é de aluna maranhense: "Pedra 'consinada'"



Pedra “consinada”
Aluna: Maria Clara Leal de Sousa

Hoje acordei cedinho, passei um café e fui para o quintal botar milho para as galinhas. Nem percebi que encostara naquela pedra preciosa trazida das cacimbas nos tempos de dona Noca, época em que quem tinha uma tropa de jumento era rico. O tempo passou sem que eu percebesse e lá se foram mais de setenta anos da minha vida, todos vividos nesta pequena cidade de São João dos Patos, no sertão maranhense.
Cá, sentada na velha cadeira de balanço, balançando a minha memória, relembro todas as histórias que vivi naquela casa de taipa, porta de talo de coco amarrada com um cordão velho, construída pelo meu avô. Uma saudade toma conta de mim e me embala rumo às minhas mais doces memórias de criança.
Ouço passos silenciosos dentro de casa na caída da noite. Sinto um toque suave no meu rosto e o perfume inconfundível da minha mãe toma conta do quarto velho e abafado. Acordei de manhãzinha com a candeia na mão para acender as trempes, pensando que era apenas um sonho bom, mas na realidade ela havia mesmo ido embora, e eu fiquei com meu pai, que trabalhava vendendo arroz, feijão e milho nas redondezas. As viagens eram demoradas, porque de vez em quando o jumento amuava e a labuta era grande para ele levantar.
Eu completava de 9 para 10 anos quando comecei a subir a ladeira para lavar roupa nas cacimbas, perto do olho-d’água. Muito antes de o sol nascer, as mulheres colocavam três caminhos de água e só depois saíam com suas trouxas de roupa na cabeça e uma penca de meninos correndo nas veredinhas atrás do “churrim” – cachorro vira-lata –, a poeira cobrindo o mundo e elas brigando com a gente. De longe dava para ouvir o tac, tac, tac da roupa batendo nas pedras e ressoando mato adentro.
De primeiro era assim: as mulheres mais velhas possuíam sua pedra “consinada”. Quando chegavam à cacimba e havia outra mulher lavando roupa no seu lugar, ela colocava a trouxa de roupa no pé da pedra e a outra logo levantava e ficava esperando até que pudesse terminar o trabalho. Imagine eu, na minha meninice, brincando com a espuma de sabão, correndo, pulando nas águas frias e cristalinas das cacimbas. O tempo passando e eu crescendo, até o dia em que finalmente ganhei a minha pedra preciosa. A felicidade foi tanta que nesse dia lavei até a minha alma.
Naquele tempo não havia escova, sabão em pó ou qualquer outra coisa que pudesse nos ajudar. A roupa era esfregada na mão, batida na pedra e colocada no quarador até que ficasse limpa como o céu no mês de agosto. O cheiro amargo do sabão de tipi, feito nas gamelas, tomava conta de nós e dos meninos que se escondiam atrás dos pés de jatobás para olhar as mulheres nuas tomando banho.
O rebuliço de mulheres correndo e se escondendo era grande, mas, no final, tudo terminava em graça. “Eita meninos danados do capeta, num tem quem possa com essas tranca ruim”, dizia dona Deusina. Depois daquele banho gostoso era hora de comer banana com farinha e fazermos o mesmo caminho de volta. À noite, o ponto de encontro para a prosa era no único poste da cidade que ficava bem ali na esquina. Sentada no tamborete, enquanto os outros papeavam, eu admirava a beleza daquela candeia que não precisava de querosene.
Agora durmo até mais tarde, levanto e ligo a máquina de lavar roupa, que jamais pensei um dia possuir. Já velha e com a vista curta, avisto-a no fundo do meu quintal, aquela que mandei buscar de tão longe para ficar ao meu lado, aquela que sustentou os meus seis filhos, aquela que me faz mergulhar nas minhas lembranças: minha pedra preciosa, que está “consinada” no meu coração.

(Texto baseado na entrevista feita com a senhora Andrelina Rosa de Alencar, 71 anos.)
Professora: Iris Nazaré Barros dos Santos
Escola: U. E. Padre Santiago S. Prieto – São João dos Patos (MA)

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Textos finalistas da Olimpíada de Língua Portuguesa 2014: dois poemas


Os dois lados do rio
Aluna: Amanda Gabrielly Dutra Alves

Lá de longe eu vi
As crianças ricas no shopping comprar,
Lá de longe eu vi
As crianças pobres no barranco a chorar.

Lá de longe eu vi
As crianças ricas um tacacá saborear,
Lá de longe eu vi
As coitadinhas pobres na poeira se apagar.

Lá de longe eu vi
Os ricos no alagadão em sua lancha ostentar,
Lá de longe eu vi
Os pobres para abrigos se mudar.

Lá de longe eu vi
As crianças ricas ovo de Páscoa ganhar,
Lá de longe eu vi
As crianças pobres o barro moldar.

Lá de longe eu vi
As crianças ricas só estudar,
Lá de longe eu vi
As crianças pobres também da família cuidar.

Lá de longe eu vi
Muitas mudanças o Acre passar,
Mas o rico sempre no domínio
E o pobre, com as lutas, sua mão calejar.

Professor: Alan Henrique Oliveira de Almeida
Escola: Escola Padre Carlos Casavecchia – Rio Branco (AC)

* * *

O meu lugar nas linhas de tantos tempos
Aluna: Miriã de Souza Nascimento

No desenrolar das linhas
É que eu enxergo o meu lugar,
São dois tipos de linhas
Sobre os quais vou lhe contar.

Entenda a origem do nome:
Vem das linhas do papel.
E a economia local:
Das linhas do carretel.

É um nome literário
Que batiza o meu lugar:
“Urupês”, nome de livro,
Pra Lobato eternizar.

O nome “Mundo Novo”
Era o nome anterior,
Por causa do café
E de todo o seu valor.

O interior do Brasil,
Jeca, o caipira doente,
As linhas de Lobato
Conversam com nossa gente.

Então, quiseram mudar,
Trocaram “Mundo Novo”
E puseram “Urupês”,
Com a aceitação de seu povo.

E a terra do grão vermelho
Continuou sua missão,
Produzindo café forte
Para o resto da nação.

Mas essa planta acabou
E depois veio o limão
Para sustentar as famílias
Que não tinham outra opção.

Duas décadas depois,
Outro cenário surgiu
E Urupês se transformou
Num alambique do Brasil.

Há muita cana e limão,
Roda muito caminhão,
Produzindo etanol
Para toda esta nação.

Terra do norte do Estado,
Perto do rio Cubatão,
Hoje é urbana e o que mais tem
É fábrica de confecção.

Para os rios, as chuvas faltaram,
Ninguém vê que a culpa é sua,
Em tempos de tanta seca,
Jogam água até na rua.

Por isso, é nas entrelinhas
Que eu posso assinalar:
Literatura e costura,
Os dois focos do lugar.

E é nas linhas desta história
Que se preserva a memória
De um município pequeno
Onde até o mal é mais ameno.


Professora: Priscila Pereira Paschoa
Escola: E. M. E. F. Professor Athayr da Silva Rosa – Urupês (SP)

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Corruptos


Até hoje as pessoas tentam entender os estranhos acontecimentos que se desenrolaram em Rio Dulce e sua incipiente urbe, no ano do senhor de 1066.
Para alguns, os fatos que serão aqui descritos tinham uma inexplicável ligação com a passagem do cometa Halley, naquele ano, pelos céus do nosso planeta.
O corrupto suserano senhor daquele feudo e incipiente urbe – e sua corrupta família – estavam ameaçados de perder o poder, pelo descontentamento cada vez maior da ralé. Também pudera: os impostos reais não estavam sendo usados para amenizar o sofrimento dos miseráveis, mas para aumentar o luxo e a devassidão do alcaide, de sua família e de seus castelões aduladores. O próprio rei havia publicado um edital em que reconhecia que as contas da administração do alcaide não condiziam com a realidade del pueblo.
Por essa razão, sentia-se no ar o cheiro de rebeldia, a insatisfação da ralé com seu corrupto administrador.
É nesse ponto que se iniciam os estranhos acontecimentos que passo a narrar.
Mesmo com todo o descrédito do alcaide e seu governo, certo dia dois representantes da ralé anunciaram estar ao lado do administrador corrupto. Ninguém acreditou, pois dias antes aquela dupla havia criticado duramente o governo do alcaide.
Camponeses, artesões e milhares de pobres vassalos ficaram tristes – e pasmos – com a atitude dos ex-líderes da ralé.
Depois foram os filósofos. Os homens que, armados da razão, criticavam o luxo e a luxúria da família do alcaide e seus aduladores, abdicaram da argumentação e a filosofia virou filosofice. O discurso reto, lógico, passou a tortuosas elucubrações: ninguém entendia mais o que agora falavam.
O próximo a esquecer suas palavras da véspera e a se aliar ao alcaide foi o beato, homem que até então se acreditava pessoa humilde e de muita fé. O beato afastou-se do grupo de fieis da ralé que lhe pediam auxílio e lhe acompanhavam e passou a ser visto nas sombras das muralhas do castelo (tentando esconder sacos reduzidos de gêneros alimentícios, os quais já não dividia com seus ex-companheiros de fé).
E, enquanto essas pessoas que outrora haviam sido porta-vozes dos vassalos e dos humildes se deixavam corromper pelo poder, o alcaide e seus guardas intensificavam a perseguição aos que se opunham aos seus desmandos. Os perseguidos mantinham-se solidários em sua dor e mesmo sob tortura continuavam expressando sua indignação contra os abusos do alcaide.
Acreditou-se por um tempo que o desvario dessas personagens, se deixando corromper – e, o que é pior, por bagatelas, como se soube depois – se devia à passagem do cometa.  Sim, pois o cometa Halley, que ainda não tinha esse nome, havia passado algumas semanas antes. E o astro, desconhecido e alvo de opiniões controversas, era facilmente associado ao fim dos tempos.  Concluiu-se, logo, que a corrupção de todos aqueles ex-membros da ralé, que dias antes se opunham ao desgoverno daquele senhor de baraço e cutelo, se devia ao medo do apocalipse.
Se devia, mas não se justificava, pois antes de se venderem ao alcaide, os porta-vozes da ralé faziam uso (ou fingiam fazer) da fé, da razão e do bom senso. O dinheiro, esse terrível proxeneta, os fez abandonar a fé, a razão, o bom senso e os escrúpulos que porventura tinham, para viver na imediata expectativa de uma nova Sodoma-e-Gomorra.
O alcaide foi deposto pela plebe.
O cometa Halley não trouxe o apocalipse.
Quanto aos ex-membros da ralé convertidos ao poder, seus filhos, netos e bisnetos conviveram por muito tempo com a vergonha de suas nefastas ações, pois embora a humanidade estivesse cansada (e hoje mais que nunca), a dignidade era e continua sendo um valor – e um dos bens mais valiosos para muitos daqueles que vivem tão somente da sua força de trabalho.

Desenho: Jô Oliveira - Burgomestre Leo Bardo

sábado, 6 de outubro de 2007

Alunos e professores do CEEFM Newton Bello começam a preparar a Feira de Ciências

"A poluição do nosso planeta é o que mais prejudica a nossa saúde hoje. Tantas pessoas estão doentes hoje por não sabermos preservar o planeta... É tão bom poder dormir e acordar com saúde! Não devemos pensar só em nós. Temos que preservar a nossa vida e a do próximo. Mas a maioria esquece de agradecer a Deus, que nos ofereceu com amor e carinho uma vida única. Vamos amar o nosso planeta."
Edna Lima
"Seja consciente: produtos com CFC aquecem o planeta e fazem mal à gente."
Lindomar de Carvalho Costa
"Se você não quer plantar uma árvore, não derrube as que outros plantaram."
Gilvan


"Seja um consumidor consciente, para não poluir o meio ambiente."
Francisco da Silva Sousa

"A natureza já tem problemas demais; seja inteligente, não destrua o meio ambiente."
Gilvan

"O meio ambiente é tudo para a gente, por isso temos que preservá-los, para podermos viver contentes."
Pedro Lopes de Andrade
Todo tipo de poluição = aquecimento e destruição.
Francisco dos Santos
"É dever de todos nós preservarmos o meio ambiente e não poluir o ar. Se todos fizermos assim, com certeza viveremos mais."
Paulo Ricardo
"Se todos fizéssemos a nossa parte, o planeta não sofreria a poluição."
José Luiz dos Santos

Alunos e professores do CEEFM Newton Bello, em Pio XII, começam a participar das oficinas de preparação para a Feira de Ciências da escola, que acontecerá no dia 31 de outubro. Acima, algumas frases criadas pelos alunos do 1º Ano C do ensino médio.

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Onde está o amor?

Gilcênio Vieira Souza

Disseram-me ontem que o Amor morreu.
Uns afirmam que seu corpo teria sido encontrado em meio aos destroços provocados pela queda de um míssil.
- Erramos o alvo - tentou justificar fria e laconicamente um diplomata.
Outros dizem que, na verdade, o Amor foi encontrado morto por um catador de lixo, que avisou às autoridades. De olhos abertos, solícitos de piedade, o corpo encolhido. Dormira na rua; morreu de frio.
Alguns divergem dessas versões. Ele teria morrido sem sofrer tanto, dizem. Após jogar dominó com os companheiros de asilo, recolheu-se contente ao quarto. De manhã, na hora do café, sentiram sua falta. Continuava na cama. Na boca, um sorriso. Num dos olhos, estranhamente, uma lágrima parada.
- Morreu em paz - foi o comentário.
A família não compareceu ao enterro. Por falta de tempo, talvez.

Discute-se, porém, a possibilidade d'Ele não ter morrido.
Não estaria passando bem, é verdade. Mas resistiria bravamente às maquiavélicas tentativas de exterminá-lo da face da Terra.
Desconfia-se que algumas pessoas estariam tratando de seus ferimentos num abrigo antimíssil. E que, apesar de quase não saírem à luz do dia, e o alimento ali ser escasso, o Amor rejuvenescera suas esperanças. O Amor teria afirmado, serenamente, que a guerra só lhe dava mais forças para continuar vivo, resistindo sorrateiramente nos corações humanos.
Há também a suspeita de que inúmeras pessoas compartilham com Ele do calor da noite. E Ele inflama seus corações de generosidade e de um corajoso otimismo.
Acredita-se que há um bom número de lares que não O expulsaram do seu convívio. Nessas famílias, o Amor continua encarando sem alarde as emoções que lhe tocam: rindo, chorando, olhando, gozando, entristecendo... Nocauteando com um humor fino e peculiar as forças adversas: ódio, inveja, rancor...

Não. O Amor não morreu.
Vive dias difíceis, sem dúvida. Mas pulsa. Pulsa teimosamente.
E as ondas do seu pulsar atingem ouvidos e corações sensíveis.
Organiza-se subversivamente em catacumbas, como os primeiros cristãos. Questiona o poder e seus representantes, cujo ódio ao povo transparece em todos os atos. Esse povo que só pede algumas migalhas de amor, nada mais.
O amor está vivo sim. Pode estar pensativo, pouco à vontade, preocupado, inquieto em seu imo. Filosofa: como unir de novo o ser humano à sua mãe Terra; como organizar um governo onde o Ministério do Amor seja o mais importante dos ministérios; como espalhar aos quatro ventos a idéia, esquecida, espezinhada, de que a fraternidade é que é o óbvio, não a guerra.
Silencias um pouco. Ouves. Ousando levantar a voz contra a anti-música das guerras e chacinas, bocas sussurram planos para a eternidade e se beijam.
Ouves. Um balbuciar de criança e o mistério do seu sorriso.
Ouves. São planos comuns que braços sofridos fraternalmente tentarão erguer. Estão com fome. Mas sonham.
Tudo isso só prova uma coisa: o Amor não morreu.

Gilcênio, 17/05/1999.